Corpos em composição: convivência, risco e presença em E nunca as minhas mãos estão vazias | BIENAL SESC DE DANÇA 2025


.               Foto: Haroldo Saboia

Em  E nunca as minhas mãos estão vazias, da Cristian Duarte em companhia, a cena se abre como um território de convivência sensível. Sons, gestos, luzes e palavras são acionados ao vivo, compondo um espaço em constante mutação. Nove artistas se movem em diferentes direções, e o encontro entre elas cria uma dança que se faz no risco, na escuta e no instante.

Há algo de instável e, por isso mesmo, vivo na maneira como as presenças se articulam. O que se vê é uma atenção contínua entre os corpos — um modo de estar junto que acolhe o atrito, o erro, o descompasso. A dramaturgia se organiza como uma estrutura porosa, aberta ao acaso, onde cada performer inscreve sua singularidade e, ao mesmo tempo, cede espaço ao coletivo.

Para a espectadora, a experiência é labiríntica: o olhar se perde e se reencontra, ora na vibração do som ou da luz, ora em um gesto quase banal que, de repente, ganha espessura. Há uma diferença marcante entre os repertórios das intérpretes — modos diversos de mover-se, de sustentar o tempo, de respirar a cena. Essa diferença tensiona e faz pulsar o conjunto, em meio a corpos que desobedecem aos padrões sociais.

Em meio ao fluxo, emerge uma pergunta sobre o tempo: o tempo da criação, da repetição, da espera. Talvez, se a duração fosse menor, alguns gestos se resolveriam; mas também se perderia algo da fricção que sustenta a cena. Entre o cálculo e o improviso, o trabalho constrói um espaço em que a convivência se torna prática artística e política, um modo de pensar a presença não como representação, mas como relação que se renova a cada instante.

Ficha técnica:

Coreografia, criação e direção: Cristian Duarte 
Criação e dança: Aline Bonamin, Allyson Amaral, Andrea Rosa Sá, Danielli Mendes, Felipe Stocco, Gabriel Fernandez Tolgyesi, Leandro Berton, Maurício Alves, Paulo Carpino Assistente de direção: Vicente Antunes Ramos 
Acompanhamento dramatúrgico: Júlia Rocha
 Iluminação: André Boll 
Concepção sonora e figurinos em companhia
Performance sonora: elenco Fotografia:Mayra Azzi, Haroldo Saboia Suporte no desenvolvimento: Casa do Povo, MoviCena/Rafael Petri Produções, Bonobos Produções Produção: Lud Picosque – Corpo Rastreado

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