Em uma mesa de bar - breve diálogo sobre a peça Chego Até a Janela e Não Vejo o Mundo
Foto: Giorgio D'Onofrio |
E aí, o que você achou da peça?
A pergunta descomprometida, mas quase obrigatória, que manifestamos na saída do teatro ao encontrar com alguém ou para quem nos acompanha.
Sentadas em uma mesa do bar, as respostas eram difusas. Gostei. Eu não... Eu ainda estou processando. Respostas triviais, para começo de conversa….
Eu gostei da trilha e da iluminação. Não gostei da trilha sonora. Achei desconexa entre si e com a peça, Algumas músicas muito maravilhosas davam o tom da cena, outras me pareceram um pouco aleatórias…
Para mim elas fizeram sentido, me tocaram. Contribuíram com as pausas, que eu achei excessivas e desnecessárias.
O problema da peça para mim foi a direção!
Para mim foi o texto!
Para mim foi o ator….
Eu curti muito as pausas. Me trouxeram reflexão, me deixaram pensativa sobre os textos e as cenas anteriores, só depois de um tempo eu percebia que elas estavam lá com um longa duração. Não me incomodaram. Eu gosto muito de pausas cênicas. Sinto que nos colocam na contramão do que temos vivido no cotidiano.
Para mim foram enfadonhas e desnecessárias. Tive a impressão que estavam ali só para alargar o tempo da peça.
Eu, em determinado momento, fechei os olhos para ver se dava um barato ficar escutando a trilha enquanto a cena estava estática e, com isso, alcançasse algo que a peça estava propondo. Mas não rolou.
Senti falta do Graciliano fumar mais cigarros em cena ou explorar mais, além do texto, sua relação com o fumo. No livro Memórias do Cárcere ele descreve a sensação de fumar um cigarro de uma forma que dá água na boca, instiga uma vontade de fumar e sentir o que ele sente.
Risos.
Eu tenho a sensação que preciso de mais informações para entender melhor essa relação entre a Nise e o Graciliano. Eu não li esse livro e sei pouco sobre ela. Eles se conheceram na prisão mesmo? Eu só poderia acompanhar, gostar ou emitir uma opinião sobre a peça se tivesse algum tipo de erudição sobre o assunto o qual não tenho?
Isso é ponto importante para pensar ... somos artistas, conseguimos falar em termos técnicos sobre alguns aspectos da cena e, ainda assim, estamos tentando traduzir o que as artistas envolvidas formularam na criação desta obra.
Achei o texto raso por isso, ao mesmo tempo que achei a peça textocêntrica.
O texto não me incomodou, me pareceu meio pós-dramático, uma apanhado de coisas que foi organizado cenicamente. Eu gostei.
Eu gostei principalmente na atuação da atriz Simone Iliecu.
Com certeza!
Ela estava brilhante! - Enfim, uma unanimidade.
Ela tinha uma sutileza na criação da personagem, uma fagulha no olhar que não se perdia em nenhum momento da peça. Alguns detalhes do seu corpo, quase imperceptíveis para a plateia, mas que eram importantes na composição do corpo cênico dela. As mãos, os dedos, os movimentos sutis….
Mas isso era mesmo necessário? Precisamos de toda essa partitura para compor uma personagem?
Acredito que nem sempre, mas foi a escolha feita nesta obra e reverberou muito bem.
Pena que o ator não acompanhou a altura…
Todos concordam.
Alguém entendeu o galo? Ninguém. Todos acham sem sentido e descartável.
As mesas para mim fazem sentido. A luz pendurada em uma corda que cai repentinamente, a outra corda que o ator interage puxando-a são elementos muito bons, mas parece que pouco aproveitados.
Sim, assim como a cena das pernas para cima. Eu tenho a impressão que a peça se esvai em uma tentativa de formar símbolos que não se concretizam….
É….
Mas, em geral, a peça é boa.
É sim, eu gostei.
E assim, entre a supérflua resposta para a pergunta espontânea: "O que você achou da peça?", forma-se a opinião dos públicos.
Sinopse
Graciliano Ramos e Nise da Silveira são presos durante a ditadura Vargas. Nesta situação de restrição absoluta, acabam se conhecendo e nasce uma amizade que se estende até o final da vida entre o escritor, um dos mais importantes do país, autor de Vidas Secas e São Bernardo, e a psiquiatra que revolucionou o tratamento psiquiátrico no Brasil com a inserção da arte na vida dos internos em manicômios. São duas personalidades muito diferentes que têm em comum o afeto, a compreensão de suas condições e o tamanho do mundo.Ficha Técnica
Texto e direção: Gabriela Mellão e João Wady Cury
Atuação: Simone Iliescu e Erom Cordeiro
Cenografia: Camila Schmidt
Desenho de luz: Aline Santini
Assistente de iluminação: Gabriela Ciancio
Trilha sonora original: Federico Puppi
Operador de som: May Manão e Lucas Bressanin
Figurinista: Dani Tereza Arruda
Preparador físico e coreógrafo: Reinaldo Soares
Cenotecnica: Denis Chamanscoffee
Contrarregragem: Ali Cury
Fotografia: Giorgio D’Onofrio
Designer gráfico: Ana Fortes – For.ma Estratégica
Produção: Letícia Alves – Corpo Rastreado
Assessoria de Imprensa: Canal Aberto - Márcia Marques e Daniele Valério
SERVIÇO
Chego Até a Janela e Não Vejo o Mundo
Temporada: 28 de março a 14 de abril
De quinta-feira a sábado, às 20h, e, domingos e feriados, às 19h
Na Sala Itaú Cultural (Piso Térreo) - Av. Paulista, 149, Jardins, São Paulo, SP
Duração: 70 minutos aproximadamente
Capacidade: 224 lugares
Classificação Indicativa: 16 anos (temas sensíveis, prisão, tortura)
Entrada gratuita. Reservas de ingressos pela plataforma INTI – acesso pelo site do Itaú Cultural www.itaucultural.org.br
Comentários
Enviar um comentário