Para meu amigo Branco revela uma faceta da sociedade que é difícil para nós brancos, olharmos, revela um estereotipado pouco comum em cena: o homem branco de esquerda racista.
Fotos de Ágatha Flora
Em cena, um homem branco, aparentemente ciente das desigualdades raciais do país; uma professora aparentemente engajada com uma pedagogia construtivista; uma reunião escolar em um colégio aparentemente progressista.... Sim, as aparências enganam. Você conhece essa história? Eu sim, bem de perto.
Passamos os últimos anos na lida combativa contra o fascismo que nos assombrava no último governo e mal olhamos para nosso lado. No entanto, combatido o maior perigo desde as últimas eleições e cada vez mais próximas de nos vermos de vez livres "dele", olhamos para lado e o que vemos? Discursos prontos sobre igualdade social, racial e de gênero feitos sob medida para posts no instagram. Pessoas de esquerda, progressistas, muito bem instruídas com seus livros embaixo do braço e citações decoradas. E então, dentro deste contexto, chegamos a uma reunião pedagógica. Este é o ambiente da peça em que algumas pessoas do público são convidadas a se sentarem na roda entre os pais.
Um pai reclama do racismo que sua filha sofreu em sala de aula e exige uma atitude da escola. A partir deste fato, infelizmente tão comum e cotidiano, desdobramentos sobre como o racismo se revela em diversas formas e jeitos, todos tão cruéis, são apresentados em cena. O lindo cenário, sugestivamente todo branco, com livros pendurados com nome de autores e autoras pretas, oferece quase uma sensação de pureza, mas pode ser lido como um símbolo de apagamento, da tentativa de esbranquiçar tudo, de colonizar, civilizar....
Além dos símbolos cénicos e da beleza dos figurinos que também se destacam em cena, a atuação é um dos grandes fortes do espetáculo. A interpretação realista nos prende e preenche. Nos confundimos entre a professora e a atriz. Um trabalho de atuação muito bem feito e visceral. Não só de quem estudou e decorou um (ótimo) texto, mas de quem está em cena defendendo uma ideia. A catarse nos movimenta. Amamos e odiamos as personagens enquanto escolhemos (temos essa coragem?) com quem nos identificamos. São papéis sociais que estão em jogo. Você é mãe ou pai? De filha branca ou preta? Você é professora? Como você lida com situações racistas?
A direção de Rodrigo França traz o movimento acertado para o espetáculo. A interação às reações do público, o silêncio, as trocas de olhares. Os jogos infantis poetizando a cena. O espetáculo é lindo e dói. Em diversas camadas, de várias formas. Há uma escolha em tratar exclusivamente do racismo. Nas entrelinhas a disputa do poder entre gêneros (se a criança preta fosse um menino? Se a professora fosse um homem? Se o pai fosse mãe?) e elitismo reverberam. Não vamos dar conta de tratar tudo em um único trabalho. Mas está ali, posto. Basta a gente olhar.
Há algo ainda para ser enfatizado: a peça nos dá respostas. Aponta caminhos. Ela quase pega nas nossas mãos para dizer: pessoas brancas façam isso, não façam aquilo. Nos impele a ação. E agora, depois de ver a peça, só nos basta agir. E novamente, pergunto: temos coragem?
SINOPSE
Pais e professores discutem o caso de racismo vivido pela menina Zuri, de 8 anos, chamada de “negra fedorenta” por um colega branco da escola.
FICHA TÉCNICA
Inspirado no Livro de MANOEL SOARES
Texto RODRIGO FRANÇA E MERY DELMOND
Direção RODRIGO FRANÇA
Elenco REINALDO JUNIOR E ALEX NADER
Atrizes Convidadas STELLA MARIA RODRIGUES (1 A 10 DE MARÇO), MARYA BRAVO (15 A 24 DE MARÇO) E MERY DELMOND
Direção de Movimento TAINARA CERQUEIRA
Cenário CLEBSON PRATES
Figurino MARAH SILVA
Iluminação PEDRO CARNEIRO
Trilha Sonora Original DANI NEGA
Consultoria Pedagógica CLARISSA BRITO
Consultoria de Representações Raciais e de Gênero DEBORAH MEDEIROS Fotografia AFROAFETO POR GABRIELLA MARIA, SABRINA DA PAZ E ÁGATHA FLORA
Identidade Visual NÓS COMUNICAÇÕES
Assessoria de Imprensa CANAL ABERTO - MÁRCIA MARQUES, DANIELE VALÉRIO E MARINA FRANCO
Operação de Som HUGO CHARRET
Operação de Luz LUCAS DA SILVA
Assistência de Produção LUDIMILA D’ANGELIS E EDUARDO RIO
Produção Executiva JÚLIA RIBEIRO
Contabilidade CRISTIANO GERALDO COSTA DOS SANTOS
Administração OSWALDO CALDEIRA PRODUÇÕES - PAULA MARTINEZ MELLO
Idealização e Direção de Produção JOÃO BERNARDO CALDEIRA
Produção SÃO BERNARDO
Instagram: @parameuamigobranco
SERVIÇO
Para Meu Amigo Branco
Data: 1º a 24 de março de 2024.
Sextas e sábados, 21h30. Domingos, 18h30.
Local: Sala de Espetáculos I do Sesc Belenzinho (Rua Padre Adelino, 1.000, Belenzinho, São Paulo)
Capacidade: 100 pessoas
Ingressos: R$40 (inteira), R$20 (meia-entrada) e R$12 (credencial plena)
Duração: 80 minutos
Classificação indicativa: 14 anos
Estacionamento
De terça a sábado, das 9h às 21h. Domingos e feriados, das 9h às 18h.
Valores: Credenciados plenos do Sesc: R$ 5,50 a primeira hora e R$ 2,00 por hora adicional. Não credenciados no Sesc: R$ 12,00 a primeira hora e R$ 3,00 por hora adicional.
Transporte Público
Metrô Belém (550m) | Estação Tatuapé (1400m)
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